
Segundo pesquisa desenvolvida pela Fundação Perseu Abramo, a cada quatro mães, pelo menos uma já sofreu algum tipo de violência obstétrica no Brasil. Se formos pegar um recorte das áreas periféricas ou de localidades camponesas mais distantes dos grandes centros, essa proporção certamente é maior. Para superar essa realidade tão cruel num momento que deveria ser apenas sublime, o mandato do vereador Fernando Carneiro, do PSOL, aprovou em 2017 a Lei das Doulas, e há cinco anos lutava para aprovar a lei que proíbe a violência obstétrica em Belém. Na última terça, 19, finalmente a casa aprovou tal matéria por unanimidade, e agora o projeto aguarda a sanção do prefeito Edmilson Rodrigues.
Tratar a parturiente de forma agressiva ou submetê-la a humilhação durante o parto; gritar com a gestante a fazendo acreditar que o bebê pode morrer por culpa dela; fazer qualquer procedimento sem o seu consentimento (como a episiotomia sem que seja estritamente necessária); impedir a mãe de ver o filho minutos depois do parto; fazer manobras como a de Kristeller (subir na barriga para expulsar a criança) ou deixar de aplicar anestesia quando a parturiente solicitar são alguns dos vários exemplos de opressão que a gestante pode sofrer na hora de parir.
HISTÓRIAS DE VIOLÊNCIA
A jornalista Leila Cruz sofreu algumas delas. Jovem sem conhecimento dos próprios direitos, ela foi destratada por uma técnica em enfermagem após dar à luz, quando queria informações sobre a filha. “Eu esperava que ela, por ser mulher, tivesse mais empatia com a minha condição”, pondera Leila. Situação que certamente seria bem diferente se ela estivesse acompanhada por alguém de confiança, ou uma doula, como as citadas leis garantem.
Já a assistente social Mariza Silva, no parto do segundo filho, viveu horas de terror e de abandono numa sala, em que mal podia gemer de dor, sob pena de ganhar bronca de uma técnica em enfermagem, que a tratou mal e negou atendimento nas vezes que a parturiente pedira apoio. Após a madrugada de sofrimento, no raiar do dia um médico finalmente entrou na sala onde ela desfalecia, quando, já quase sem forças, a paciente conseguiu pedir socorro. O médico de imediato percebeu a gravidade da situação, e realizou o parto imediatamente, mas com atraso que gerou consequências cruéis. Mariza precisou ficar duas semanas internadas, e o filho, após várias semanas na UTI, não resistiu e faleceu.
“Depois que o meu filho morreu, não tive nem forças para registrar um Boletim de Ocorrência contra aquela mulher, mesmo porque eu era leiga sobre os meus direitos”, relata Mariza. Segundo ela, é lamentável que profissionais da saúde, que têm como principal atribuição cuidar da vida, neguem direitos nessa hora tão delicada, por isso ela parabeniza o vereador Fernando Carneiro pela aprovação da lei, que é mais um instrumento para garantir que histórias como essas não mais se repitam.
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